quinta-feira, 16 de julho de 2009

Reeleição (na OAB) - Minha preocupação

Reproduzo abaixo um e-mail que escrevi rapidamente em resposta a diversas pessoas que me mandaram mensagens preocupadas com a questão da reeleição.

Tenho recebido uma série de e-mails, de pessoas que nem conheço nem faço a mínima idéia de como descobriram meu endereço de e-mail, todos com uma preocupação aparentemente legítima: impedir a reeleição na OAB.

Mesmo estando residindo em Pernambuco, de início fiquei satisfeito em perceber que tantos colegas se preocupam em manter uma "OAB Democrática", simpatizei com as mensagens iniciais até porque eu mesmo sou contra reeleições e continuísmo; as mais recentes, contudo, vêm me preocupando, senão pela quantidade em que me enviam mas pelo seu conteúdo...

É preciso lembrar que menções à tensão entre pré-compromisso (estabelecer previamente as regras do jogo) e democracia não é recente, remete pelo menos ao séc. XVIII e a autores como Hume e Locke, sem do que um dos argumentos mais recorrentes a favor do pré-compromisso é que em períodos de calmaria ou de comoção a vontade da maioria poderia ser manipulada e aproveitada para manter e perpetuar determinadas estruturas de poder... Pensemos num governante altamente demagogo que se legitima no poder através de plebiscitos e um aparelho estatal de propaganda e teremos uma imagem clara de como a vontade da maioria pode ser manipulada.

Em conexão à questão do pré-compromisso está outra questão, que é a da possibilidade de mudança das regras do jogo no decorrer do próprio jogo (perdoem a tautologia), sendo que o problema da manipulação da vontade da maioria se aplica a ambos os casos (pré-compromisso e mudança de regra no decorrer do jogo).

Ocorre que este argumento a favor do pré-compromisso pressupõe a ignorância dos eleitores (que o diga Ackerman), e é exatamente este o ponto que me preocupa... Pensemos no seguinte, se falarmos em reeleição presidencial ilimitada, num país como o Brasil, onde a massa não tem acesso à educação, poderemos estar abrindo as portas à ditadura...

Isto é exatamente o que me preocupa no teor de algumas mensagens, elas parecem pressupor que nós advogados somos um bando de ignorantes incapazes de perceber e de rechaçar o continuísmo através das eleições, e quer me parecer que isto é injusto.

Posso estar afastado e saudoso do Ceará (e do Cariri pra ser mais preciso), mas me lembro muito bem de todos os colegas com quem me formei e com quem vim a conviver nos corredores e salas forenses, sendo que a imagem que guardo de tais pessoas é de profissionais bem preparados e, sobretudo, altamente politizados! Me parece absurdo pressupor que a possibilidade de reeleição (ainda que ilimitada) iria converter tais profissionais em massa de manobra a fim de perpetuar uma determinada oligarquia na OAB!

Claro que a minha visão é parcial, falo por mim mesmo e pelos profissionais com quem convivi, e é justamente porque não conheço todos que deixo a pergunta que me impeliu a escrever tal e-mail: será que somos, nós advogados, tão estúpidos a ponto de não sabermos lidar com a reeleição?

E se não formos, como poderemos estar a altura do múnus público que desempenhamos?

Baseado no teor de alguns e-mails que recebi, que pareciam sugerir que se eu pudesse iria permanecer reelegendo indefinidamente o mesmo presidente para a OAB, acho que estas perguntas devem ser refletidas, pelo nosso bem em quanto advogados e cidadãos e da própria OAB. A quem estamos falando neste momento? A uma massa de desinformados ou a verdadeiros advogados?

De minha parte, tanto não sou a favor da reeleição num panorama geral, como, numa perspectiva mais específica, acho extremamente salutar o que alguns vêm fazendo no sentido de demonstrar as falhas da atual administração e relembrar o fato de que alguns dos que hoje são a favor da reeleição eram contra quando esta não lhes interessava. Isto, a meu ver, é pura expressão da democracia.

Para encerrar, se este e-mail lhe aborreceu de alguma forma, eu registro meu pedido de desculpas, mas quero de deixar bem claro que estou apenas respondendo os e-mails que me foram enviados sobre a questão da reeleição, acho que quando me enviaram tais e-mails me deram o direito de respondê-los... De fato, alguns até conclamavam o meu engajamento na causa, então... Se alguém gostou e porventura estiver disposto a debater o paradoxo – ainda que aparente – entre pré-compromisso, mudança de regras e democracia, basta me escrever e manterei o debate com o maior prazer.

Este e-mail também será exposto no meu blog: http://oqed.blogspot.com/

Um fraternal abraço do colega que sente tanta saudade de conviver com vocês!

Francysco Pablo Feitosa Gonçalves


Reproduzi a mensagem ipsis litteris, o que obviamente inclui os erros da original, peço que ignorem tais erros e o eventual sentim entalismo - mesmo tendo sido tão bem acolhido pelo Pernambuco, é impossível não sentir falta do Ceará...

Vamos debater a questão da reeleição?

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Salada de assuntos: Briga de Galo, Vaquejada e Jurisdição Constitucional...

Recentemente estive pensando sobre o Mato Grosso, as brigas de galo e a jurisdição constitucional brasileira...

Bem, antes de prosseguir, devo dizer desde já que sou contra briga de galo! Nada contra você se você gosta, mas é só que eu, francamente, não vejo nenhuma graça...

Pois bem, agora que estamos nos entendendo, vamos pensar naquela decisão do Tribunal de Justiça do Mato Grosso que reconhece a briga de galos como uma manifestação cultural importante do estado... Não sabe do que estou falando? Clique aqui!


Em Cuiabá, rinha de galo tem endereço certo. Uma associação avícola, ironicamente conhecida entre os freqüentadores, como Sangue, promove brigas toda a semana. A polícia já tentou fechar o local, mas, por uma decisão judicial, a atividade continua.

Em 11 anos foram três julgamentos, todos favoráveis à associação que mantém a rinha. No ultimo, os desembargadores entenderam que a briga de galos é uma manifestação cultural e torna Mato Grosso o único local do país em que a rinha é amparada pela Justiça.


Como tal decisão já provocou muita comoção, tanto nos adeptos da briga de galo como principalmente em quem é contra, eu proponho aqui uma reflexão um pouco diferente. Esqueçamos, apenas por um instante, a crueldade para com os galináceos e pensemos apenas no povo do Mato Grosso... Será, e eu disse será, que a briga de galo não é realmente um elemento importante da cultura do Mato Grosso? E se ela for, estaria correto o tribunal em reconhecê-lo e afastando tal elemento da ilicitude?

Mas briga de galo realmente deve ser um negócio brutal e eu não conheço o Mato Grosso pra saber se é um elemento cultural, ou não; assim sendo, vamos falar de uma manifestação cultural importante daqui do Nordeste, a vaquejada.

Bom, eu imagino que não é lá muito agradável pro boi desatar na carreira, ser puxado pelo rabo e levar uma senhora queda... Ah sim, não nos esqueçamos que eventualmente o rabo se quebra, ficando na mão do vaqueiro!


Mais uma vez esquecendo a questão do sofrimento dos animais, é certo que a vaquejada é um esporte e uma manifestação cultural típica do Nordeste brasileiro! Agora imaginem, no nosso sistema de jurisdição constitucional, se a questão vai parar no STF: Vaquejada, pode ou não pode?

Também não quero pensar no que decidiriam nossos ilustres Ministros, o ponto onde quero chegar, depois de tanto arrodeio é: será que o STF, em Brasília, é a Corte correta para dizer o que deve ser a Constituição em cada estado do Brasil? Ou seria melhor que os Tribunais Estaduais tivessem um poder de decisão maior, ao menos em algumas matérias, o que permitiria – quem sabe – que tais decisões fossem mais próximas da realidade de cada estado da federação...

Agora, faço mais uma pergunta, seja a briga de galo uma manifestação cultural matogrossense, ou não, quem é a pessoa ou o órgão mais adequado para dizê-lo?

Deixo a questão em aberto, não tenho uma resposta sobre isso, e espero que a menção à briga de galo e à vaquejada atraia comentários.